sexta-feira, janeiro 11, 2008

Editorial

Do direito humanitário às benesses da justiça

10 / 01 / 08

Os brasileiros costumam dizer que a justiça no país “não funciona”. De certo modo, eles têm razão. Senão, vejamos. Um dos presos, no assalto a um supermercado, em Itajaí (leia matéria, neste site), é condenado a mais de 100 anos de prisão. Nicolau Werenicz, 59 anos, autor de roubos milionários, no Sul do país, desde a década de 1970, foi beneficiado com a saída temporária, e nunca mais se apresentou à justiça do Rio Grande do Sul. Era considerado foragido.

No estado de Santa Catarina, os juízes também costumam ser muito caridosos, na prática daquilo que se denomina de direito humanitário. Os senhores e senhoras da capa preta, liberaram um considerável número de sentenciados, para festarem, nas ruas, durante o Natal e o Reveillon. Até o dia 4 de janeiro, data prevista para o retorno, 250 bandidos, alguns acusados por estupro, homicídio, roubo, assalto, não tinham retornado à Penitenciária de Florianópolis e à Colônia Agrícola de Palhoça. O que os transforma em foragidos.

Questionemos! Não nos calemos! Cobremos uma postura mais apropriada da justiça. Como pode, um criminoso violento, perigoso, como esse tal Nicolau Werenicz, condenado a cumprir mais de 100 anos de cadeia, ser liberado para passar sete dias com a família. Ele passou sete dias, sim, com as famílias das novas vítimas, assaltando, roubando, ameaçando matar. Criminoso como Nicolau e esses que foram gentilmente liberados para as festas, na Grande Florianópolis, deveriam cumpri integralmente as sentenças. No caso de Nicolau, 100 anos são 100 anos. Nem um dia a menos.

Desde as décadas de 1970 e 1980, muito escrevi sobre os crimes praticados pelo bandido Nicolau. Um bom homem, segundo o juiz que o libertou. Um bandido violento, segundo os policiais. “Eu mato para não deixar provas", é a frase favorita de Nicolau. No assalto a um supermercado, em Itajaí, dois bandidos, parceiros de Nicolau, morreram, no intenso tiroteio com policiais. Felizmente, morreram.

Quando a imprensa, legítima representante da sociedade civil, questiona essas benesses da justiça, aqueles que representam o Poder Judiciário, instituição que deveria ser bem mais rigorosa no combate à criminalidade, alegam, simplesmente, que estão cumprindo a lei. “A lei que protege os bandidos”, diz a voz do povo. Liberam bandidos perigosos, em cumprimento à lei. Temos que admitir, são forçados a cumprir a legislação, mesmo sendo ela de procedência duvidosa. Mas, certamente, se as vítimas de estupro, latrocínio, homicídio, assalto, roubo, fossem sistematicamente familiares de membros do Judiciário, é óbvio que a justiça não liberaria bandidos com tamanha facilidade. Mesmo sendo cega. Estudos mais aprofundados, com base na psicologia forense, seriam realizados em cada um dos condenados, com direito às regalias da liberdade. Que, com certeza, não seriam concedidas.

E por que afirmamos que são leis de procedência duvidosa? Porque seus autores, membros do Congresso Nacional, Câmara e Senado, muitos deles, transformaram a instituição que representam em esconderijo da justiça, beneficiados que são pelo estatuto da impunidade, na forma de imunidade parlamentar e foro privilegiado. Por isso, a legislação que produzem, principalmente a penal, quando já não caducou, acaba beneficiando os autores de crimes e prejudicando as vítimas. Até porque, convenhamos, não se pode esperar leis rigorosas daqueles que se envolvem em crimes de corrupção – como o mensalão. Tais leis, de procedência duvidosa, acabam por beneficiar bandidos de colarinho fino e importado e também os criminosos do tênis sujo.

Tratemos, também, do direito humanitário. Uma versão caipira do Direito, que, invariavelmente, costuma privilegiar os bandidos, a começar pelo consagrado “em caso de dúvida, pró réu”. Qualquer advogado de porta de cadeia está devidamente preparado para proporcionar dúvidas em delegacias e tribunais, fabricando álibis que nem sempre são investigados devidamente. Advogados e muitos juízes, defensores dessa vertente humanitária, se debruçam sobre processos, inicialmente vasculhando em busca de alguma falha de instrução, de alguma prova mais frágil, para devolver o criminoso às ruas, onde ele volta a cometer os mesmos tipos de crimes.

Há que se mencionar, ainda, a ardorosa ação de grupos de direitos humanos, sempre muito empenhados em socorrer e agradar bandidos e seus familiares, mas que jamais estendem uma mão, jamais dedicam um gesto de carinho para as vítimas ou seus parentes enlutados. O direito humanitário se mistura com teses de um socialismo caótico e deságua na política clientelista do governo da república do mensalão. Como se vê, todos unidos formam um grupo poderoso, que trai e penaliza o cidadão honesto. Favores e teses humanitárias protegem delinqüentes que, em se tratando de robustos menores, são chamados de “meninos – Não se pode penalizar esses meninos” – disse, não faz muito tempo, o presidente Lula da Silva, dias após um grupo de adolescentes ter arrastado, com um carro roubado, um garoto até a morte, no Rio de Janeiro.

Benesses da justiça, liberdade sem critérios para a bandidagem, impunidade para os corruptos, teses do direito humanitário, estão elevando a criminalidade a números alarmantes. E os brasileiros, que pagam uma das maiores cargas tributárias do mundo, não tem direito aos elementares quesitos de segurança pública.

Quem pode, paga a segurança privada, cuja significativa renda, verdadeiras fortunas, vai cair, quase sempre, nas mãos dos próprios políticos. Quando donos das empresas de segurança e fábricas de produtos eletrônicos, os políticos são os beneficiários diretos da desgraça do povo. Se não são os proprietários, acabam se beneficiando, indiretamente, com o financiamento de campanha, caixa dois. Assim, para alguns políticos, o crime é conveniente. Com o crime correndo solto, alguns políticos safados estão ganhando muito dinheiro.